quarta-feira, 10 de junho de 2015

O rigor, a misericórdia e a graça de Deus.


De acordo com a Bíblia, qual a “intensidade” da disciplina de Deus imposta aos seres humanos após a desobediência no Jardim do Éden?

As dores de parto impostas a mulher não a impediram de gerar “filhos e filhas”. A afirmação “e gerou filhos e filhas” ocorre na narrativa referindo-se a Adão (e sua mulher), a Sete, a Enos, a Quenã, a Maalalel, a Jarede, a Enoque, a Matusalém e a Lameque (com suas respectivas esposas). Haja parto!

A dificuldade de produzir alimento, a partir da terra, imposta ao homem, não foi tão intensa a ponto de impedir que Caim, que era agricultor, se orgulhasse em sua autossuficiência e desprezasse a Deus em suas atitudes.

A morte do ser humano, como consequência da desobediência, não foi instantânea. Adão viveu 930 anos, Sete 912 anos, Enos 905 anos, Quenã 910 anos, Maalalel 895 anos, Jarede 962 anos, Enoque não morreu, mas Deus o tomou, Matusalém 969 anos e Lameque 777 anos.

Na realidade o primeiro ser humano que morreu, Abel, não morreu de forma natural, mas foi assassinado, aparentemente antes mesmo de se casar, pelo seu próprio irmão (e na realidade, não poderia ser diferente, do contrário teria que ter sido seu pai ou sua mãe). Outras duas mortes mencionadas antes das mortes naturais foram executadas por Lameque, descendente de Caim, que também de forma descontrolada e desproporcional matou um homem por feri-lo e um jovem por pisa-lo.

Se prestarmos atenção, a misericórdia e graça divina estão presentes desde o início do Antigo Testamento, ao contrário do que muitos acreditam e se ouve por aí.

terça-feira, 9 de junho de 2015

A disciplina do Pai



Parece-me que YHWH, o Deus da Bíblia tem como grande desejo a formação de uma grande família. Desde o princípio criou o homem à Sua imagem e semelhança e soprou em suas narinas do Seu folego, Seu Espírito. Aceitando uma imagem de YHWH corrompida, apresentada pela serpente, o homem também se desfigurou de sua imagem inicial bem como daquele momento em diante, contaminado pela mentira, teve uma imagem distorcida de seu Criador.
Hoje, percebo que naquele momento, YHWH não amaldiçoou o casal edênico, mas a serpente e a terra (terra = adamá, em hebraico, de ode veio Adam (Adão), o primeiro homem). Porém, disciplinou a ambos. Disciplina, como sabemos, serve para ensinar algo, ajudar a compreender, instruir.
À mulher, impôs maior sofrimento no momento do parto, a dificuldade para “multiplicar-se e povoar a terra”. A incredulidade e a desobediência humana proporcionaram a YHWH grande dor e sofrimento para ver Seus filhos multiplicarem-se em uma grande família, dominando a terra em justiça e gozando de paz e prosperidade.
Ao homem, Adam, foi imposto a dificuldade de tirar da terra o fruto, a terra (adamá) não daria das plantas produtivas, “agradáveis aos olhos e boas para alimento” que haviam no Jardim, mas agora no campo, ervas, com espinhos e ervas daninhas. YHWH havia trabalhado com a terra para criar o homem, formoso, fértil e agradável. Agora tornara-se deformado, corrompido e rebelde, não correspondendo com as expectativas do Criador, causando-Lhe dor e sofrimento. Um filho revoltado.
Os sofrimentos e dificuldades então impostas ao casal permitem-lhes perceber a condição divina. O deus YHWH sofre desde o princípio e revelou isso de forma mais concreta em Jesus.
Porém os planos de YHWH não foram destruídos. Sua família está crescendo e está sendo preparada para habitar na nova terra, na plenitude que Ele sempre desejou ao ser humano.
Aqueles que veem no Cristo o Deus Criador e percebem quem Ele realmente é, também compreendem suas próprias deformações e corrupções e podem ser transformados através do novo nascimento, crescendo em “estatura e graça” na presença do Pai.
Não por menos, a nova realidade que está por vir é expressa em Apocalipse como um casamento. Jesus Cristo, o Filho, como Noivo, e os crentes (aqueles que acreditam Nele), a Noiva. Os fiéis neste mundo serão a Nora do Criador. Como Rute, que abandonou sua vida anterior para fazer parte de uma nova família, a família de YHWH.

sexta-feira, 29 de maio de 2015

Paralelo I: Abraão e Ló

Bruce Waltke, em seu comentário do livro de Genesis, apresenta algo interessante sobre o paralelo das histórias de Abraão e Ló nos textos do capítulo 18 e 19 de Genesis, quando anjos vieram visita-los e transmitir-lhes algo que alteraram suas vidas. Lembrando que a história nos conta que Ló peregrinava juntamente com seu tio Abraão desde Hur (cidade na região onde atualmente fica o Iraque), mas a partir de um momento, devido ao aumento de seus rebanhos, decidiram seguir rumos distintos, pois a terra onde estavam não comportava ambos. Abraão, apesar de ser mais velho, em um gesto de humildade, permite que Ló seja o primeiro a escolher o local para estabelecer-se. Este, vê o vale verdejante bem irrigado do rio Jordão e o escolhe, habitando próximo a Sodoma, cidade que o narrador descreve como perversa. Abraão fica na terra de Canaã:

 
-Abraão estava diante da porta de sua tenda (habitação de peregrino).
-Ló estava em frente da porta da cidade de Sodoma (sinal de que se tornara uma autoridade naquela cidade próspera, mas perversa).

-Abraão, em humildade, roga para que os visitantes parem e se acheguem à sua tenda para comerem “algo”. Porém, quando os visitantes aceitam o convite, manda preparar uma mesa farta, com prontidão (ou agitação?), participando ele mesmo do preparo, apesar da idade, com o melhor que tinha, para acolher seus visitantes, ficando ao lado e em pé, debaixo da árvore, enquanto os visitantes comiam, sugerindo colocar-se em situação inferior, de servidão.
-Ló também convida e oferece aos visitantes um banquete, mas como um homem próspero e de autoridade, manda que seus servos preparem a refeição e come com os visitantes. Embora ambos (Abraão e Ló) devam ter oferecido pão sem fermento devido a urgência da situação, o narrador faz questão de mencionar este fato apenas no caso de Ló.

-A mensagem dos anjos para Abraão era de vida: ele teria um filho, apesar de sua idade avançada.
-A mensagem para Ló era para alertá-lo do perigo: deveria abandonar a cidade, pois sua destruição estava chegando devido a perversidade nela reinante, que ultrapassara o limite da tolerância divina.

-Após a refeição, os anjos perguntam onde estava Sara, sua esposa.
-Os anjos perguntam se Ló tinha mais familiares na cidade.

-Ao ouvir a mensagem, Sara ri, mas depois de repreendida, arrepende-se e posteriormente, recebe a promessa.
-Ao ouvir a mensagem, os futuros genros de Ló pensaram que ele estava brincando e não o ouviram, perdendo suas vidas.

-Abraão, em sua humildade, mas com iniciativa e habilidade, “negocia com Deus” para evitar a destruição da cidade de Sodoma, conseguindo uma condição para que ela não fosse destruída.
-Ló, apesar de ser um dos líderes da cidade, hesitante e atrapalhado (chegando a oferecer suas filhas), não consegue impedir que os habitantes da cidade tentem abusar sexualmente de suas visitas.

-Abraão, como peregrino no campo, intercede por Sodoma por compaixão de seus habitantes, procurando preservá-la.
-Ló pede para que possa ir para Zoar (uma outra, porém pequena cidade) pensando em si, pois não conseguia desvincular-se das comodidades da vida urbana.

-Abraão recebe a promessa: um filho, de sua esposa, Sara.
-Ló perde sua esposa e embriagado por suas filhas tem filhos com elas (incesto).

Esta, e outras observações, estão no comentário de Bruce Waltke, uma dessas pessoas que dedicam suas vidas para que possamos compreender melhor as Escrituras Sagradas.

Segundo o ensinamento destes eventos, humildade, hospitalidade, compaixão e fé são importantes para uma vida abençoada por Deus. Ser bem-sucedido dentro de um sistema corrupto, pode ser sinal de um coração dividido, trazendo desgraça para sua vida e da sua família.
Waltke, conclui a análise do trecho com o seguinte:

“Ele (Ló) falha como anfitrião, como cidadão, como marido e como pai. Ele quer proteger seus hospedes, mas precisou ser protegido por eles; ele tenta salvar sua família e eles pensam que ele está brincando; com medo de caminhar para as montanhas, ele suplica por uma pequena cidade, mas com medo da cidade, ele foge para as montanhas. Sua salvação depende da misericórdia de Deus e da benção de Abraão. ”

terça-feira, 19 de maio de 2015

Atos dos Apóstolos ou Atos do Espírito?



    Interessante verificar no livro de Atos o fato de que, apesar de Estevão ter sido escolhido para tratar de assuntos materiais (necessidades carnais) como cuidar dos suprimentos de viúvas judias que falavam grego, para que os apóstolos se dedicassem ao ensino e a oração (necessidades espirituais), ele também foi usado pelo Espírito para o ensino, realização de sinais e a pregação. Acabou sendo morto, justamente pelo que pregou e ensinou, tornando-se o primeiro mártir da igreja[i]. Outro colega de Estevão, Felipe, que também havia recebido dos apóstolos a mesma tarefa que Estevão, por sua vez, foi usado pelo Espírito para levar o evangelho a Samaria. Tarefa que, aliás, havia sido designada aos apóstolos por Jesus. Será que os apóstolos estavam reticentes em cumprir sua missão? Será que estavam acomodados em Jerusalém? Felipe também foi usado para apresentar o evangelho a um alto funcionário da rainha dos etíopes, Candace[ii].
    Será que uma das lições que o livro de Atos queira nos ensinar seja o fato de que o Espírito Santo age, muitas vezes, a despeito das decisões dos líderes. Talvez, tentando nos dizer que, mesmo as autoridades da igreja, embora crentes e habitadas pelo Espírito Santo, não conseguem perceber a amplitude da obra e os desígnios divinos. Estes fatos também nos mostram que os apóstolos também não eram perfeitos, mas susceptíveis a erros e fraquezas. Podemos ver isso no episódio em que Paulo repreendeu Pedro por agir com hipocrisia, ao afastar-se da comunhão com os cristãos não judeus por temer que os cristãos judeus o criticassem por isso[iii]. Aliás, Paulo é outro exemplo da ação do Espírito sobrepondo-se às decisões apostólicas. Logo após a ascensão de Jesus, os onze apóstolos decidiram escolher alguém para substituir Judas Iscariotes. Fizeram isso com base em textos do Antigo Testamento e o fizeram através de sorteio, escolhendo Matias. Porém, no decorrer da história, quem acaba sobressaindo-se como apóstolo (ἀπόστολος = enviado, em grego), protagonizando o próprio livro de Atos, é Paulo.
    A obra é de Deus, apesar das vontades e decisões humanas. Quem pode conter o Ruah Elohim (וְר֣וּחַ אֱלֹהִ֔ים = Vento/Espírito de Deus)? “Aquele que tem ouvidos ouça o que o Espírito diz às igrejas. ” Apocalipse 2:7


[i] Atos dos apóstolos, capítulos 6 e 7.
[ii] Atos dos apóstolos, capítulo 8.
[iii] Carta de Paulo aos Gálatas, capítulo 2, versículos 11 a 16.